Naquela noite, a paz no orfanato parecia ilusória. Enquanto as outras meninas dormiam, Michelle permanecia acordada, sentada junto à janela do dormitório. A lua cheia iluminava o pátio e, com ela, vinham memórias que ainda sangravam.
As palavras de Enzo voltavam à sua mente: *"Você merece tudo de melhor."* Era difícil acreditar nisso, depois de tudo o que viveu. Ser deixada pela própria mãe, viver em abrigos, enfrentar o desprezo da sociedade… tudo havia endurecido seu coração. Mas Enzo estava começando a quebrar aquela armadura.
Na manhã seguinte, Dra. Emília chamou Michelle em sua sala. Havia um envelope em cima da mesa, e o semblante da diretora era mais sério que o normal.
— Michelle, eu encontrei algo nos arquivos do orfanato. Informações sobre sua mãe… e talvez sobre seu pai.
Michelle congelou. Nunca ouvira falar sobre seu pai. Helena, mesmo nas poucas vezes em que aparecia, evitava qualquer menção.
— O nome dele aparece em um relatório antigo. Armando Villar. Preciso confirmar mais detalhes, mas… talvez você tenha família viva.
Michelle sentiu o chão fugir. Família? Depois de tantos anos acreditando estar completamente só?
— E minha mãe? — ela sussurrou.
— Nada certo ainda. Mas posso investigar com sua autorização.
Michelle assentiu lentamente, sem saber o que esperar.
Naquela mesma tarde, Enzo passou para visitá-la. Trouxe flores — pequenas margaridas brancas.
— Pra te lembrar que até as flores mais simples podem florescer nos terrenos mais improváveis — disse ele, sorrindo.
Michelle sorriu de volta. Mas no fundo, sabia que, com o passado batendo à porta, o caminho até a luz ainda seria longo.